Dentre outras importantes inovações, a Lei nº 13.874/19 (Lei da Liberdade Econômica) possibilitou a limitação da responsabilidade dos prestadores de serviços de fundos de investimento. A Instrução CVM nº 555/14, contudo, ainda exige a responsabilidade solidária entre o administrador e os demais prestadores de serviços. A minuta de resolução objeto da Audiência Pública SDM nº 08/20 (Minuta) vem, finalmente, regulamentar o disposto na Lei da Liberdade Econômica.
Nos termos da redação vigente da Instrução CVM nº 555/14, o contrato celebrado entre o administrador e determinados prestadores de serviços deve estabelecer a responsabilidade solidária pelos prejuízos causados aos cotistas em razão de condutas contrárias ao regulamento, à lei ou aos atos normativos da CVM.[1]
Primeiramente, a Minuta propõe a segregação das atividades exercidas pelo administrador e pelo gestor, que passam a ser definidos como “prestadores de serviços essenciais”, e atribui a cada um deles a competência para contratar prestadores de serviços específicos em nome do fundo.
A Minuta prevê, ainda, em linha com a Lei da Liberdade Econômica, que o regulamento deve dispor sobre a limitação da responsabilidade dos prestadores de serviços, bem como os parâmetros para a sua aferição.[2]
A Minuta exige a manutenção da responsabilidade solidária, perante os cotistas, apenas nas seguintes hipóteses:
- público em geral: se os serviços forem prestados para classe de cotas destinada ao público em geral, a responsabilidade solidária entre os prestadores de serviços essenciais e os terceiros contratados por condutas contrárias ao regulamento ou às normas aplicáveis não pode ser afastada;[3]
- tesouraria, controle e processamento de ativos: na contratação de serviços de tesouraria, controle e processamento de ativos do fundo, o administrador e o prestador de serviços devem ser responsáveis solidários por eventuais prejuízos causados;[4]
- cogestão da carteira: caso o gestor contrate um cogestor, o gestor deve ser solidariamente responsável pelo descumprimento do regulamento ou das normas vigentes pelo cogestor;[5] e
- consultoria especializada: especificamente para os fundos de investimento em direitos creditórios, o gestor e o consultor especializado devem ser responsáveis solidários pela observância do regulamento e das normas legais e regulamentares.[6]
Perante a CVM, os prestadores de serviços continuam sendo responsáveis por seus próprios atos e omissões contrários ao regulamento, à legislação e à regulamentação, sem solidariedade, observado o dever de fiscalização atribuído a determinados prestadores de serviços.[7]
Espera-se que, com a implementação das disposições da Lei da Liberdade Econômica pela Minuta, haja o aumento da segurança jurídica e o fomento ao desenvolvimento da indústria de fundos de investimento no Brasil. Para tanto, será de enorme importância que o Poder Judiciário, quando provocado a decidir sobre o tema, assimile tais inovações normativas e se atente às particularidades dos serviços fiduciários prestados por administradores e gestores de fundos.
[1] Artigo 79, §2º, da Instrução CVM nº 555/14 (redação semelhante já constava no artigo 57, §2º, da Instrução CVM nº 409/04, que foi revogada pela Instrução CVM nº 555/14).
[2] Artigo 44, §1º, da Minuta.
[3] Artigo 76, §2º, da Minuta.
[4] Artigo 79, §6º, da Minuta.
[5] Artigo 80, §5º, da Minuta. O artigo 78, §5º, da Instrução CVM nº 555/14, atualmente, prevê a necessidade de responsabilidade solidária dos cogestores pelos atos de gestão compartilhada.
[6] Artigo 38, §3º, do Anexo II à Minuta.
[7] Artigo 79, §4º, da Instrução CVM nº 555/14 e artigo 77 da Minuta.