MP da Liberdade Econômica: marco regulatório para os fundos de investimento

Foi publicada, em 30 de abril, a Medida Provisória nº 881 (MP 881), também conhecida como “MP da Liberdade Econômica”. Dentre outros assuntos, a MP 881 incluiu três novos artigos no Código Civil que tratam dos fundos de investimento, o que confere maior segurança jurídica para essa indústria. Porém, há pontos que podem ser aprimorados.

A MP 881 define os fundos como a comunhão de recursos, sob a forma de condomínio, destinada à aplicação em ativos financeiros e atribui à CVM a competência para discipliná-los.

Embora seja muito bem-vinda a criação de um marco legal para os fundos de investimento, a indicação de que os fundos devem aplicar seus recursos exclusivamente em ativos financeiros não é precisa. Isso porque há diversos fundos, como os fundos de investimento em direitos creditórios e os fundos de investimento em participações, que podem investir em bens e direitos (por exemplo, créditos e participações em sociedades de capital fechado) que não seriam considerados ativos financeiros.

A competência da CVM para regular e supervisionar os fundos de investimento cujas cotas sejam objeto de oferta pública decorre da redação da Lei nº 6.385/76.[1] No entanto, há dúvidas sobre a competência da CVM para disciplinar certos fundos cujas cotas não sejam colocadas publicamente. A própria CVM já apresentou entendimento no sentido de que há fundos de investimento que não estariam sob sua fiscalização.[2]

A MP 881 atribui à CVM a regulação e a supervisão dos fundos de investimento, independentemente da forma de distribuição de suas cotas ou de qualquer outro aspecto, de modo que afasta dúvidas acerca da aplicação das regras da CVM a todos os fundos. Esse fato tem especial relevância se considerarmos que o Judiciário, de modo geral, não tem fundamentado suas decisões relacionadas a fundos de investimento em normas específicas da CVM sobre o tema.[3] Assim, além de estender a regulação da CVM indistintamente a todos os fundos de investimento, o que por si só amplia a segurança jurídica dessa indústria, há uma expectativa de que a MP 881 contribua para que tal regulação passe a ser observada pelo Judiciário.

A MP 881 dispõe, ainda, sobre a limitação de responsabilidade dos cotistas e dos prestadores de serviços dos fundos, como administradores e gestores. Passa a ser permitido que o regulamento de cada fundo limite a responsabilidade dos seus cotistas ao valor das cotas de sua titularidade, bem como elimine a solidariedade entre os prestadores de serviços do fundo. Apesar desse importante avanço, poderia se ter dado um passo adicional no que se refere à limitação da responsabilidade de prestadores de serviços fiduciários, por exemplo, afastando-se a aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC) à prestação desses serviços.

Tem sido frequente a aplicação do CDC, pelo Judiciário, na relação entre os investidores e os prestadores de serviços de fundos de investimento. Esse posicionamento traz implicações relevantes, como a responsabilização objetiva desses prestadores, a solidariedade entre eles e a possibilidade de inversão do ônus da prova. Isso leva a um desbalanceamento da relação de risco e retorno no que se refere à prestação desses serviços, e tem impactado negativamente no desenvolvimento da indústria de fundos de investimento.

Embora haja pontos de melhoria, como os indicados acima, a MP 881 representa um importante marco para a indústria de fundos de investimento, e deve ser bem recebida pelo mercado.

[1] As cotas de fundos ofertadas publicamente são valores mobiliários nos termos do artigo 2º, V e IX, da Lei nº 6.386/76.

[2] De acordo com a interpretação dada pelo Colegiado da CVM à Lei nº 6.385/76, na decisão do Processo Administrativo nº 19957.003689/2017-18, em 30 de outubro de 2018, não caberia à CVM regular todos os fundos de investimento, principalmente no caso de fundos cujas cotas não sejam objeto de distribuição pública.

[3] Fato constatado em pesquisa, realizada pelo escritório, de dezenas de julgados envolvendo fundos de investimento do Superior Tribunal de Justiça, dos Tribunais Regionais Federais e dos Tribunais de Justiça de São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Paraná e Tocantins.

 

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