Em setembro de 2023, a Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”) iniciou a Consulta Pública SDM nº 01/2023 (“Consulta Pública”), que propunha alterações à Resolução CVM nº 81 (“Resolução 81”), a fim de modificar regras referentes a assembleias de acionistas de companhias abertas, e ampliar o engajamento dos investidores, como havia afirmado o presidente da CVM, João Pedro Nascimento[1]. Após alguns meses de tramitação da Consulta Pública, com o recebimento de manifestações de participantes do mercado, a CVM editou, em 4 de junho de 2024, a Resolução CVM nº 204 (“Resolução 204”), que altera as normas aplicáveis às assembleias de companhias de capital aberto (essencialmente as resoluções nº 80 e 81 da CVM).
Para atingir seu objetivo com a reforma regulatória, a CVM buscou simplificar o processo de votação, para torná-lo mais inclusivo e financeiramente acessível, o que, considerando as experiências práticas recentes, se consolidou em um fortalecimento do boletim de voto a distância (“BVD”), mecanismo que se propõe a eliminar diversos custos e dificuldades envolvidas na participação em assembleias.
Em resumo, as principais alterações introduzidas pela Resolução 204 são:
- obrigatoriedade de divulgação do BVD para todas as assembleias de acionistas (gerais ou especiais, ordinárias ou extraordinárias);
- possibilidade de dispensa da divulgação do BVD em caso de baixa adesão dos acionistas à votação a distância, exceto se houver requisição por acionistas representantes de pelo menos 0,5% do capital social;
- redução da antecedência necessária ao envio do BVD pelos acionistas e pelas companhias para 4 e 21 dias, respectivamente (em vez de 7 dias e 1 mês) – ressalvadas as assembleias gerais ordinárias, ordinárias e extraordinárias (concomitantes), e as assembleias para eleição de membros dos conselhos fiscal e de administração em razão de vacância da maioria dos cargos;
- desconsideração dos pedidos de instalação do conselho fiscal enviados via BVD, caso não tenham sido indicados candidatos ao órgão até a data da assembleia;
- desconsideração dos pedidos de adoção de voto múltiplo transmitidos pelo BVD, caso não haja candidatos ao conselho de administração para além dos indicados pela administração ou pelo acionista controlador;
- vedação a que as companhias condicionem o exercício de direitos em assembleia pelos acionistas à apresentação de documentos que comprovem a titularidade de ações, caso tais informações possam ser objetivamente verificadas com base nos registros da companhia[2];
- possibilidade de disponibilização, pelas companhias, de um ou mais espaços físicos – além de sua sede – para participação nas assembleias;
- simplificação dos procedimentos para transmissão das instruções de voto por depositários centrais e escrituradores, que passam a poder encaminhar os mapas de votação e demais informações em até 48 horas antes da assembleia;
- divulgação dos mapas de votação dos escrituradores e depositários centrais em até 24 horas antes da assembleia, podendo os mapas consolidados ser divulgados até o início do encontro;
- em comparação à Consulta Pública, a Resolução 204 retirou a possibilidade de se votar no BVD a respeito de propostas apresentadas durante a realização da assembleia e que não constavam na ordem do dia.
De maneira geral, as novidades trazidas pela Resolução 204 nos parecem capazes de ampliar, em boa medida, a participação nas assembleias, sobretudo pela disponibilização do BVD em todas as reuniões. Tal novidade deve proporcionar uma redução global dos custos relacionados à participação, estimulando mais investidores a participar das assembleias.
No mesmo sentido, a definição de prazos mais generosos para envio dos BVD pelos acionistas, somada à possibilidade de disponibilização de espaços físicos alternativos para participação, e à facilitação à comprovação da titularidade das ações também pode reduzir o absenteísmo.
Adicionalmente, com a previsão da possibilidade de dispensa da disponibilização do BVD nos casos de baixa adesão dos acionistas à votação a distância, a Resolução 204 também se mostra positiva para as próprias companhias abertas. Como a obrigatoriedade de envio do BVD para todos os encontros configura um ônus regulatório não desprezível, a isenção dessa exigência para as companhias cujos acionistas não possuem interesse em utilizar o boletim parece uma solução eficaz para mitigar ineficiências.
As novas normas aplicáveis às assembleias de acionistas entrarão em vigor a partir de 2 de janeiro de 2025 e, até lá, companhias e investidores deverão adaptar-se aos novos mecanismos de funcionamento e participação das assembleias.
[1] Informamos sobre a Consulta Pública em artigo anterior, disponível em: https://www.vidigalneto.com.br/artigos/a-consulta-publica-sdm-no-01-2023-e-a-ampliacao-da-participacao-em-assembleias-de-acionistas.
[2] Violações a tal regra configuram infração grave, para os fins da Lei 6.385/76 (Lei do Mercado de Capitais).