Comentários de direito societário quanto à eleição de novo membro do Conselho de Administração da Petrobrás

A substituição do ex-presidente e ex-membro do Conselho de Administração da Petrobrás Brasileiro S.A. (“Petrobrás” ou “Companhia”), o Sr. Jean Paul Prates (“Sr. Prates”), pela atual ocupante dos cargos, Sra. Magda Maria de Regina Chambriard (“Sra. Magda”), gerou ampla polêmica e foi ponto central de discussões ao longo dos últimos meses devido à não convocação de uma Assembleia Geral Extraordinária por parte da Petrobrás para formalizar a indicação e a concreta substituição. É fundamental destacar, desde já, que o tema continua em discussão e está sob análise confidencial pela CVM. Portanto, as avaliações apresentadas são baseadas nas informações parciais disponíveis até o momento, sendo que a evolução do caso pode trazer novas perspectivas e dados relevantes.

Para contextualizar, em 15 de maio de 2024, o Conselho de Administração da Petrobrás decidiu pelo encerramento antecipado do mandato do Sr. Prates como presidente da Companhia. Em consequência dessa decisão, o Sr. Prates formalizou sua renúncia ao cargo de membro do Conselho de Administração da Petrobrás. No mesmo dia, o Conselho de Administração indicou a Sra. Magda para os cargos de presidente e membro do Conselho de Administração da Companhia. Esta escolha está alinhada com o estatuto social da Petrobrás, que estabelece que o presidente da Companhia ocupa, ex officio, uma posição no Conselho de Administração[1].

Em continuidade à indicação supramencionada, em 24 de maio de 2024, o Conselho de Administração da Companhia nomeou a Sra. Magda como conselheira e a elegeu como nova presidente da Companhia, sem convocar uma Assembleia Geral Extraordinária para esse fim. A nomeada tomou posse em ambos os cargos e passou a integrar o Conselho de Administração da Companhia imediatamente. Diante desse cenário, como melhor será explicado a seguir, os acionistas minoritários da Companhia solicitaram uma Assembleia Geral Extraordinária para deliberar acerca da destituição do Sr. Prates e da eleição do novo membro do Conselho de Administração. Contudo, a Companhia alegou que a convocação não seria necessária, tendo em vista que o Sr. Prates não foi destituído de seu cargo, mas renunciou a ele, iniciando, assim, o conflito com os acionistas minoritários da Companhia.

Tendo em vista o histórico acima, o cerne do conflito está no interesse dos acionistas minoritários participarem ativamente da escolha dos membros do Conselho de Administração, tendo em vista a relevância do órgão para a Companhia[2], que tem, por exemplo, a competência de eleger e destituir os diretores da Companhia e fixar-lhes as atribuições, observado o que a respeito dispuser o estatuto. A Sra. Magda já vem, inclusive, exercendo esse poder ao indicar 3 (três) novos membros para a composição da Diretoria Executiva em junho de 2024, que foi apreciada pelo Comitê de Pessoas e, em seguida, aprovado em âmbito do Conselho de Administração da Companhia, em 4 de julho de 2024.

A reivindicação dos acionistas minoritários pela convocação de uma Assembleia Geral Extraordinária para tratar da questão fundamenta-se em duas teses principais. Primeiramente, argumentam que o Sr. Prates foi eleito conselheiro da Companhia por meio de sistema de voto múltiplo[3]. Nesse contexto, a legislação estipula que, na ausência de suplente para o cargo, a Assembleia Geral deve proceder a nova eleição[4]. Em segundo lugar, os acionistas minoritários possuem o direito legal de solicitar a convocação de uma Assembleia Geral, uma vez que detêm mais de 5% (cinco por cento) do capital social da Companhia[5].

O Conselho de Administração da Companhia, em reunião realizada em 7 de junho de 2024, decidiu por maioria não acolher os pedidos dos acionistas para convocação de Assembleia Geral Extraordinária, sem explicar quais requisitos da Lei das Sociedades Anônimas não estavam sendo efetivamente cumpridos.

A falta de justificativas da Petrobrás aos acionistas minoritários ensejou uma carta da AMEC (Associação de Investidores no Mercado de Capitais) pedindo esclarecimentos à Companhia. Argumentou que a citada alínea “c” traz tão somente o critério estabelecido em lei referente ao percentual de representação para pedido de convocação de uma Assembleia-Geral (5%), além do requisito de que o pedido seja devidamente fundamentado, com indicação das matérias a serem tratadas. No entanto, os acionistas minoritários alegam que tudo teria sido cumprido na solicitação realizada.

Ademais a CVM está elaborando um parecer técnico sobre o caso, que ainda está sob sigilo, mas que, segundo trechos encontrados na carta da AMEC, que pediu vistas, pode-se deduzir está ao lado dos acionistas minoritários, defendendo que uma discordância com relação à justificativa apresentada pelos acionistas minoritários não pode ensejar a não convocação de Assembleia Geral, visto que no requerimento são observados os requisitos previstos na alínea “c” do parágrafo único do artigo 123. Nesse sentido, os administradores da Companhia não estariam investidos de autoridade para julgar se a fundamentação invocada pelo acionista ou acionistas solicitantes é suficiente ou não para que promovam a convocação da Assembleia-Geral.

A direção da Petrobras segue firme em seu posicionamento e já afirmou por meio de notas públicas que não considera a exigência necessária, pois, oficialmente, o Sr. Prates renunciou ao cargo, não se enquadrando em destituição de membro do Conselho de Administração, devendo, assim, ser seguido o procedimento do Artigo 27 do Estatuto da estatal[6]. Com isso, sob perspectiva da Companhia, bastava que a Sra. Magda fosse eleita no próprio conselho, sem necessidade de realização de assembleia-geral extraordinária para sua ratificação.

Toda essa discussão chama atenção para a necessidade de observação cautelosa dos requisitos legais e estatutários aplicáveis a cada situação fática para composição, eleição e dissociação de Conselho de Administração, sob pena de incorrer em processo administrativo perante a CVM. Inclusive sobre este caso em específico, há análise da CVM sobre possíveis irregularidades em processo administrativo[7]. Aponta-se que os administradores de maneira explícita estão flexibilizando interpretações, incorrendo em falha, estando expostos a eventuais processos dentro da CVM.

Há expectativa de que a Petrobras venha a público novamente para sinalizar a convocação dessa assembleia ou seguir eventualmente os caminhos administrativos de recursos internos da CVM. Muito provavelmente é só o início da discussão e esses Processos CVM e o Parecer Técnico 51/2024-CVM/SEP/GEA-3 de 26 de junho de 2024 quando tiverem acesso público serão uma forte fonte de precedentes sobre Conselho de Administração englobando os posicionamentos mais atualizados da autarquia sobre a temática.

 

 

[1] “Art.18- O Conselho de Administração será integrado por, no mínimo, 7 (sete) e, no máximo, 11 (onze) membros, cabendo à Assembleia Geral dos Acionistas designar dentre eles o Presidente do Conselho, todos com prazo de gestão unificado que não poderá ser superior a 2 (dois) anos, admitida a reeleição. §6º- O Conselho de Administração deve ser composto apenas por membros externos, sem vínculos estatutários ou empregatícios atuais com a Companhia, exceto quanto ao membro designado como Presidente da Companhia e ao membro eleito pelos empregados.

[2] Atuação dos acionistas minoritários na eleição de membros do conselho de administração – Vidigal Neto Advogados

[3] https://www.vidigalneto.com.br/artigos/atuacao-dos-acionistas-minoritarios-na-eleicao-de-membros-do-conselho-de-administracao

[4] Art. 141. Na eleição dos conselheiros, é facultado aos acionistas que representem, no mínimo, 10% (dez por cento) do capital social com direito a voto, esteja ou não previsto no estatuto, requerer a adoção do processo de voto múltiplo, por meio do qual o número de votos de cada ação será multiplicado pelo número de cargos a serem preenchidos, reconhecido ao acionista o direito de cumular os votos em um só candidato ou distribuí-los entre vários. § 3º Sempre que a eleição tiver sido realizada por esse processo, a destituição de qualquer membro do conselho de administração pela assembléia-geral importará destituição dos demais membros, procedendo-se a nova eleição; nos demais casos de vaga, não havendo suplente, a primeira assembléia-geral procederá à nova eleição de todo o conselho.

[5] Art. 123. Compete ao conselho de administração, se houver, ou aos diretores, observado o disposto no estatuto, convocar a assembléia-geral. Parágrafo único. A assembléia-geral pode também ser convocada: c) por acionistas que representem cinco por cento, no mínimo, do capital social, quando os administradores não atenderem, no prazo de oito dias, a pedido de convocação que apresentarem, devidamente fundamentado, com indicação das matérias a serem tratadas;

[6] Art. 27- O Presidente e os Diretores Executivos não poderão ausentar-se do exercício do cargo, anualmente, por mais de 30 (trinta) dias consecutivos ou não, sem licença ou autorização do Conselho de Administração. §4º- No caso de vacância do cargo de Presidente, o Presidente do Conselho de Administração indicará o substituto dentre os demais membros da Diretoria Executiva até a eleição do novo Presidente nos termos do art. 20 deste Estatuto.

[7] Processos CVM nº 19957.007768/2024-19 e 19957.005946/2024-77

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