Nesta temporada de assembleias gerais ordinárias de companhias abertas pareceu haver um expressivo aumento da atuação de acionistas minoritários, especialmente por meio da indicação e eleição de candidatos indicados aos conselhos de administração.
A Lei nº 6.404/1976 (“Lei das Sociedades por Ações’) traz dois mecanismos que asseguram aos acionistas minoritários o direito de ter uma participação ativa para indicação e eleição de seus candidatos.
O primeiro mecanismo é o voto múltiplo, previsto pelo artigo 141 da Lei das Sociedades por Ações. Nos termos do dispositivo legal, acionistas representantes de, no mínimo, 10% por cento do capital social com direito a voto da companhia podem requerer a adoção do procedimento. Vale destacar que, para as companhias abertas, a CVM reduziu o percentual mínimo exigido pelo artigo 141 da Lei das Sociedades por Ações, estabelecendo o percentual em função do valor do capital da companhia, nos termos do artigo 3º da Resolução CVM 70/22.
A adoção do voto múltiplo permite que o número de votos de cada ação seja multiplicado pelo número de cargos do conselho a serem preenchidos e que os acionistas possam alocar suas ações na proporção desejada entre os candidatos. Ou seja, os minoritários, se assim desejarem, têm a faculdade de alocar a totalidade de suas ações no candidato por eles indicado, aumentando assim a probabilidade de que seja eleito para compor o conselho.
A fim de garantir a organização prévia da companhia e dos próprios acionistas na tomada de decisão de seus votos em caso de adoção do sistema, o artigo 141, §1º da Lei das Sociedades por Ações prevê que o requerimento de instalação do processo de voto múltiplo deve ser apresentado pelos minoritários com antecedência mínima de 48 horas da assembleia geral. Uma vez deferido o pedido, a companhia deve publicar um aviso aos acionistas acerca da adoção do procedimento de voto múltiplo, e, salvo eventual desistência do pedido, a sistemática fica automaticamente instalada para a respectiva assembleia, com efeito para todos os acionistas presentes.
O segundo mecanismo que visa garantir a representação dos minoritários no conselho de administração é a votação em separado, prevista pelo artigo 141, §4º da Lei de Sociedades por Ações. Por meio deste procedimento, os minoritários podem eleger um membro do conselho de administração em colégio eleitoral apartado ao do bloco de controle. Portanto, quando instalada a votação em separado, há uma garantia de que os minoritários conseguirão eleger um ou mais de seus candidatos, uma vez que a eleição se dará por deliberação da maioria dos minoritários votantes, sem a participação dos acionistas controladores.
Consoante previsto em lei, têm a prerrogativa de requerer esta votação os acionistas que representem, no mínimo, 15% do total de ações com direito a voto e os acionistas detentores de, pelo menos, 10% das ações preferenciais sem direito a voto, sendo que cada um destes grupos de acionistas pode requerer concomitantemente a adoção do procedimento, formando-se dois colégios eleitorais de minoritários em assembleia.
Em que pese a Lei de Sociedades por Ações exija o quórum mínimo de 15% para os minoritários ordinaristas, o Colegiado da CVM manteve a interpretação definida no Processo CVM nº RJ2005/5664 referente ao artigo 141, §5º da referida Lei, consignando ser possível a instalação da votação em separado por minoritários detentores de 10% das ações com direito a voto do capital social nos casos em que a companhia tenha emitido somente ações ordinárias.
Diferentemente do voto múltiplo, a eleição em separado tem como requisito a comprovação de que os acionistas votantes detêm a titularidade ininterrupta das ações utilizadas para a votação nos 90 dias anteriores à data da assembleia. Esta previsão do artigo 141, §6º da Lei das Sociedades por Ações visa evitar que os chamados “minoritários de véspera” se utilizem da prerrogativa legal para participar da administração das companhias.
Dado que, em regra, cada ação confere ao acionista o direito a um voto e, portanto, as mesmas ações não podem ser utilizadas para votar no processo de voto múltiplo e no de votação em separado, é de suma importância que os minoritários tenham em mente que podem requerer e participar de ambos os procedimentos em uma mesma assembleia, desde que ações diversas possam ser utilizadas para compor as votações.
Assim, caso os minoritários pretendam eleger seu(s) candidato(s) por meio de votação em separado, poderão requerer a instalação do procedimento de voto múltiplo somente com as ações que não sejam utilizadas na eleição em separado de conselheiros.
Como visto, somente o pedido de voto múltiplo deve ser obrigatoriamente realizado com antecedência à assembleia, todavia, conforme estabelecido no Processo CVM nº 19957.003630/2018-01, a desistência deste requerimento pode se dar a qualquer tempo pelos acionistas, inclusive durante a assembleia. Deste modo, ainda que apresentado o pedido de voto múltiplo, os acionistas poderão retirá-lo e utilizar suas ações para compor a votação em separado se instalada no momento da assembleia.
Assim, conforme orientações da CVM (Processo CVM nº SP2016/0245), durante as deliberações os acionistas serão instados a se manifestar se desejam prosseguir o procedimento ou desistir dele e adotar a eleição em separado – não havendo óbice para a adoção de ambos os procedimentos, se aplicável. Havendo o pedido para adoção dos dois mecanismos, a ordem de deliberações na assembleia será a de votação em separado anteriormente à eleição de voto múltiplo, de forma a conferir aos acionistas as informações necessárias para que decidam de qual dos sistemas desejam participar e distribuam seus votos no seu melhor interesse.