Em operações de fusão e aquisição, é comum que as partes condicionem a conclusão do negócio à satisfação de determinadas condições precedentes, as quais podem demorar algum tempo para serem cumpridas. Em alguns desses casos, mostra-se especialmente presente a preocupação de que algum tipo de imprevisto relevante ocorra durante esse período, de modo que o comprador queira recuar da sua decisão de fechar a transação.
Suspensão da atividade empresarial por autoridade governamental, perda da capacidade de geração de receita, contaminação ambiental no imóvel, escândalo de corrupção e crise em determinado setor da economia são alguns dos fatos capazes de alterar drasticamente as condições e premissas sobre as quais os contratos foram originalmente pensados pelas partes e que, uma vez materializados, podem levar à perda da atratividade do ativo ou ao aumento de riscos e responsabilidade com os quais as partes talvez não estivessem contando inicialmente.
A alocação eficiente de riscos entre as partes – que geralmente supõe atribuir o risco à parte que possuir mais informação e controle sobre determinado evento – e a proteção do comprador contra a conclusão forçada de um negócio indesejado, assim, é o que explicam a utilidade e popularidade da cláusula MAC (material adverse change), também intitulada MAE (material adverse effect) nos contratos de fusões e aquisições.
Tal mecanismo contratual possibilita ao comprador terminar antecipadamente o contrato, antes da conclusão da operação, uma vez materializados certos acontecimentos que alteram, de forma relevante, a situação da empresa objeto da aquisição. Portanto, a vantagem deste instrumento é que ele dispensa a intervenção judicial ou arbitral para ganhar eficácia, bastando a declaração de vontade do titular do direito – não significando isso, vale dizer, que o contratante descontente não possa recorrer ao Poder Judiciário ou à arbitragem para buscar a anulação do ato do qual discorde.
São geralmente considerados efeitos adversos relevantes aqueles eventos que impactam o funcionamento usual da empresa objeto da transação, afetando a sua capacidade econômico-financeira, ou que aumentam a exposição do comprador a riscos e responsabilidade. Dada a sua finalidade de abarcar eventos futuros e incertos, a cláusula MAC possui alta complexidade e costuma ser um ponto sensível na negociação. Daí a importância de as partes despenderem tempo e esforços em sua elaboração.
Da observação da prática é possível dividir a estrutura da cláusula MAC em três grandes pontos: eventos gerais, eventos específicos e ressalvas. Eventos gerais são aqueles fenômenos econômicos, políticos ou sociais não exclusivos àquele negócio, pois sucedem em um contexto mais amplo e global, mas que acabam afetando-o de alguma forma, direta ou indiretamente (guerra ou greve generalizada em determinado setor da economia, por exemplo). Eventos específicos representam acontecimentos próprios àquela transação em concreto, tornando-a especificamente antieconômica e desinteressante (licença de funcionamento vencida que leva à interdição da fábrica, ou perda de receita ou insuficiência ativa decorrente de falha contábil, por exemplo).
Já as ressalvas são exceções feitas aos conceitos genéricos e amplos tipicamente empregados nas cláusulas MAC. Buscam limitar o sentido e alcance do que será considerado efeito material adverso para fins de autorização do término antecipado pelo comprador. Trata-se, assim, de técnica contratual que beneficia o vendedor, pois redistribui os riscos do negócio, em especial aqueles sobre os quais ele não possui controle ou informação (crise econômica mundial que afeta mais a sociedade-alvo em relação aos concorrentes, mas não aquela que atinge a todos por igual, por exemplo), ou aquelas motivadas pelo próprio comprador (fuga de clientes diante da figura institucional do comprador, por exemplo).
Importante ponderação que os contratantes devem fazer em relação ao tema diz respeito a qual evento deve ser interpretado como material adverso. Pode-se argumentar que efeito material adverso somente deve ser assim considerado se seus efeitos se projetarem e persistirem no tempo, não sendo contempladas, para os propósitos da cláusula MAC, flutuações sazonais ou pontuais na sociedade-alvo. O desempenho histórico da sociedade-alvo também deverá ser levado em consideração para se saber se aquele efeito é fruto de uma conduta atípica do vendedor, ou se faz parte do ciclo normal da sociedade-alvo.
Embora já exista extensa discussão e aplicação deste instituto nos Estados Unidos, no Brasil a cláusula MAC ainda anda a passos lentos, sem encontrar respaldo legal. Poder-se-ia aproximá-la do instituto da resolução por onerosidade excessiva, prevista no artigo 478 do Código Civil. Segundo este, caso a prestação de uma das partes contratantes se torne excessivamente onerosa, representando grandes vantagens para a outra, e em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá ela exigir a extinção antecipada do contrato. Já a doutrina e a jurisprudência nacional mostram-se tímidas ao tratarem do assunto, o que pode ser explicado pelo fato de a maioria das disputas em contratos de fusão e aquisição serem submetidas a arbitragem, que costumam ser sigilosas.
Assim, referida lacuna legal em torno da cláusula MAC põe em evidência a importância de os agentes econômicos dedicarem especial atenção a tais cláusulas, de modo a regularem em detalhes o alcance e o funcionamento de tal dispositivo contratual. A cautela tem o potencial de evitar interferência de juízes ou árbitros, que dificilmente dispõem do mesmo nível de informação que os contratantes, ou simplesmente visa garantir, de antemão, um alinhamento comum das expectativas das partes quanto ao funcionamento e alcance da cláusula MAC.