O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) publicou, em 11 de junho de 2024, o Provimento nº 172, de 5 de junho de 2024, por meio do qual restringiu o uso de instrumento particular para formalização da alienação fiduciária de bens imóveis. Assim, como regra geral, a alienação fiduciária em garantia de imóveis deverá ser celebrada por escritura pública, o que torna a sua utilização mais custosa e burocrática.
A determinação, fruto da decisão proferida pelo CNJ no âmbito do Pedido de Providências nº 0008242-69.2023.2.00.0000, visa a pacificar e consolidar, em âmbito nacional, o entendimento manifestado pelo CNJ no Procedimento de Controle Administrativo nº 0000145-56.2018.2.00.0000, julgado em agosto de 2023, que reconheceu a validade do artigo 954 do Provimento Conjunto nº 93/2020 do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais.
O Provimento nº 172 traz uma interpretação restritiva do artigo 38 da Lei nº 9.514, de 20 de novembro de 1997, segundo a qual a permissão para a formalização de alienação fiduciária de imóveis e de atos conexos por meio de instrumento particular, com efeitos de escritura pública, seria aplicável apenas a entidades autorizadas a operar no âmbito do Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI), incluindo as cooperativas de crédito.
O CNJ fundamenta sua decisão no artigo 108 do Código Civil, que exige a escritura pública para a “validade dos negócios jurídicos visando à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País”. Segundo a decisão, os dispositivos da Lei nº 9.514/97 somente afastariam a aplicação de tal artigo para integrantes do SFI. Na decisão, esclarece-se que existem outras exceções legais à exigência de escritura pública, como atos envolvendo administradoras de consórcio de imóveis e entidades integrantes do Sistema Financeiro de Habitação.
Consta no Provimento nº 172 que o CNJ visa a propiciar maior segurança jurídica às operações no setor imobiliário e fortalecer os direitos dos cidadãos, sobretudo dos hipossuficientes, bem como a incentivar políticas de desjudicialização, em alinhamento a seus objetivos estratégicos.
A decisão do CNJ é controversa, tanto nos seus aspectos materiais, quanto formais, inclusive no que se refere à sua competência para legislar ou interpretar legislação federal. Adicionalmente, vai na contramão dos objetivos de se ampliar a autonomia individual e de se criar um ambiente de negócios menos burocrático, mais dinâmico e competitivo trazidos pela Lei nº 13.874, de 20 de setembro de 2019 (Lei de Liberdade Econômica), e pela Lei nº 14.711, de 30 de outubro de 2023 (Marco Legal das Garantias).
Ainda que se possa admitir que a determinação, em tese, traz segurança jurídica para a forma de contratação da alienação fiduciária de imóveis, é inegável que os efeitos negativos são relevantes e imediatos.
A alienação fiduciária de imóveis vem sendo largamente utilizada em negócios entre particulares. A necessidade de utilização de escritura pública para sua contratação implica incremento relevante nos custos e no tempo necessário para a constituição dessa garantia. Adicionalmente, a participação de um terceiro (o tabelião) na relação jurídica, o qual deverá analisar e validar os termos e condições já acordados entre os contratantes, pode restringir ou inviabilizar a realização de certas operações legítimas, mas que não sigam padrões convencionais.
As Corregedorias Gerais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal têm o prazo de 30 dias, contado da publicação do Provimento nº 172, que ocorreu em 11 de junho de 2024, para se adequar à decisão do CNJ.