Após um longo processo de diálogo entre a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e o mercado, em especial no âmbito da Audiência Pública SDM nº 02/21, foi publicada, em 13 de julho de 2022, a Resolução CVM nº 160 (Resolução 160), que dispõe sobre as ofertas públicas e a negociação de valores mobiliários em mercados regulamentados.
A Resolução 160 traz importantes inovações e, ao entrar em vigor, passará a conter todo o arcabouço regulatório relacionado ao regime de ofertas públicas de valores mobiliários, substituindo a Instrução CVM nº 400/03, que trata das ofertas sujeitas a registro prévio pela CVM, e a Instrução CVM nº 476/09, que disciplina ofertas públicas com esforços restritos (Ofertas Restritas), entre outras normas esparsas que regulam o tema.
A Resolução 160 contempla dois ritos de registro de oferta: o ordinário, cujo registro é precedido da análise prévia da CVM, e o automático, que prescinde de tal análise. Deixam de existir, portanto, as ofertas públicas automaticamente dispensadas de registro, como é o caso das Ofertas Restritas. Existem, porém, casos expressamente previstos em que o normativo não é aplicável, entre os quais se incluem as ofertas de cotas de fundos de investimento exclusivos e as ofertas subsequentes destinadas a cotistas do próprio fundo no caso de fundo ou classe de cotas com menos de 100 cotistas e cujas cotas não estejam admitidas à negociação em mercado organizado.
O rito automático já tem previsão na Instrução CVM nº 400/03. No entanto, propõe-se que as hipóteses para sua adoção sejam consideravelmente ampliadas, de modo que esse passe a ser a provável alternativa para as estruturas que, hoje, se utilizam da Oferta Restrita. Trataremos, abaixo, das principais diferenças entre a Oferta Restrita, atualmente vigente, e o rito automático de registro de oferta previsto na Resolução 160.
Há um rol taxativo de valores mobiliários que podem ser objeto de Oferta Restrita. Ainda, a Oferta Restrita deve ser destinada exclusivamente a investidores profissionais. Já a Resolução 160 estabelece que o rito automático é aplicável a um universo mais amplo de ofertas públicas. A depender do atendimento de certos critérios, tais como público-alvo, tipo de valor mobiliário e a frequência de acesso ao mercado de capitais pelo emissor, confere-se a possibilidade de adoção do rito automático. A norma também estabelece os documentos cuja apresentação é exigida para obtenção de registro pelo rito automático.
Com pouquíssimas exceções, o rito automático pode ser adotado para qualquer oferta destinada a investidores profissionais ou qualificados. Para o registro automático de ofertas destinadas exclusivamente a investidores profissionais ou de cotas de fundo de investimento financeiro fechado destinadas exclusivamente a investidores qualificados, não é necessária a apresentação de lâmina nem prospecto. Já para as ofertas destinadas aos demais investidores, a apresentação desses dois materiais é obrigatória. As exigências aplicáveis à preparação de prospecto foram sensivelmente modernizadas e padronizadas pela Resolução 160. Confeccionar documentos de oferta mais objetivos e palatáveis aos potenciais investidores, e facilitar a comparação entre diferentes produtos são alguns dos objetivos dessas mudanças.
Em uma Oferta Restrita, é permitida a procura de, no máximo, 75 investidores e, no máximo, 50 deles podem subscrever ou adquirir os valores mobiliários ofertados. De modo a evitar que essa restrição seja burlada, o emissor não pode realizar uma nova Oferta Restrita da mesma espécie de valor mobiliário por um período de 4 meses contados do encerramento da Oferta Restrita anterior.
A Resolução 160 elimina qualquer limitação do número de investidores que podem ser procurados ou que podem investir nos valores mobiliários cuja oferta tenha sido registrada pelo rito automático. No mesmo sentido, não há restrição temporal para realização de novas ofertas sob o mesmo rito de registro.
À semelhança do regramento vigente para Ofertas Restritas, o rito automático também possibilita que emissores sem registro na CVM acessem o mercado de capitais por meio de ofertas públicas. Para tanto, os valores mobiliários ofertados devem ser representativos de dívida e os destinatários da oferta, exclusivamente investidores profissionais.
Os valores mobiliários que sejam objeto de Oferta Restrita não podem ser negociados em mercado regulamentado por um prazo de 90 dias da respectiva subscrição ou aquisição. Após esse prazo, como regra geral, a negociação pode ser realizada somente entre investidores qualificados.
De acordo com a Resolução 160, não há restrição temporal para negociação dos valores mobiliários cuja oferta tenha sido registrada pelo rito automático. Existe, ainda, para cotas de fundos fechados, debêntures simples (e outros valores mobiliários de dívida) de emissor registrado e títulos de securitização de securitizadoras registradas, previsão de ampliação do público alvo a cada período de seis meses. Por exemplo, caso sejam objeto de uma oferta registrada sob rito automático destinada a investidores profissionais, esses valores mobiliários poderão ser negociados, após um período de seis meses, também com investidores qualificados. Depois de outros seis meses, investidores em geral passarão a poder adquirir esses mesmos ativos no mercado secundário. Para debêntures simples (e outros valores mobiliários de dívida) de emissor frequente de renda fixa, conforme definição da Resolução 160, o prazo para ampliação do público alvo é de três meses. Para os demais valores mobiliários, há regras específicas que permitem ou não a ampliação do público alvo para negociação em mercado secundário.
A Resolução 160 entra em vigor no dia 2 de janeiro de 2023. No entanto, as ofertas que estejam em curso nessa data permanecerão sendo regidas pelas normas vigentes na data do protocolo do requerimento do registro ou da informação do início da oferta, inclusive no que tange às restrições à negociação no mercado secundário.
(Esse informativo é, em boa medida, uma atualização do que foi publicado em março de 2021.)